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sábado, 12 de novembro de 2011

Vamos fugir

Vamos fugir, eu mesmo e a minha consciência: Vamos fugir pra bem longe daqui, pras matas verdejantes próximas ao rio Manguaba: e depois a gente deságua no mar, num catamarã pintado de verde, azul e amarelo, com frisos pretos e faróis acesos à tardinha, no por do sol. Eu e minha consciência, meus pés, meus braços e mãos: E a minha cabeça – o meu espírito vai junto: às vezes ele se desliga e sobe até uns quinze ou vinte metros olhando lá de cima e se apavora com medo de cair e volta.
Mas estamos em busca de um lugar ao sol pra ficar e colher baronesas na água: Na terra construir uma casa com sala, cozinha, varanda e um quarto no sobrado com toilette: a janela de frente pro rio. De manhã logo cedinho ligamos o rádio e vamos pescando notícia, conversando com os moradores e a polícia, “o prefeito não estava, a guarda municipal ficou atolada na estrada”, não, agora é Verão.
Mas eu posso descolar um cantinho legal fora da alta temporada, yeah, vamos fugir, bebê, não dá mais pra continuar assim somente vendo o tempo passar e compondo aforismos. Não há motivo pra ficar assustado com a fuga se ela se faz à rota: Abri a porta: as bananeiras começam a parir na várzea, o pescador acena detrás do raio de luz, na outra margem. As nuvens crescem resplandescendo no céu como oráculo e ornáculo. O mundo é perfeito, “pronto, estou fora, estamos todos bem, eu, minha consciência, meu corpo e o meu orgulho”, bem na hora, então: Pode ser agora.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Tempo acabado

Não há tempo mais pra nada, acabou o tempo. Não há tempo de espera, esperar o quê? Você já fez de tudo. Uma espera e permanência e tantas atribulações – nem vamos falar de pecado num sentido cristão... Pois bem, mas é o tempo, o tempo que se fica inerte ou se atropela o tempo. Então, pra mim está acabado, não sobrou tempo nenhum.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Pronto pra Tudo

Eu estou pronto pra tudo. Esquecer o passado e continuar seguindo por esse longo e cimentado aqueduto que é a minha trajetória de vida (econômica, familiar, social, literária, religiosa) desde que nasci e desde aquela primeira vez que peguei o lápis e o papel e então comecei a escrever.
Como se eu já soubesse (antes mesmo de aprender a ler e escrever) e só agora estou pronto – calmo e disposto. Sempre estive perto dessa coisa, observando a luz que vinha de fora, os pequenos vagalumes piscando no terraço escuro, o centro de tudo rodando até um ponto vago do meu próprio universo interno e pessoal. Uma boa imagem – o reflexo de um passado, de uma infância, de desejos sagrados e da fera espreitando no mato pra me tomar de assalto, a bela...
Eu sempre soube do perigo – e como isso era a própria vida, quer dizer, intrínseco a ela. Não posso reclamar de nada, nem das maldades, do chute na bunda enfim, o que importa é o aqui e agora e você estar vivo. Olhando os vagalumes lá fora, o vagabundo comendo as suas custas, todo mundo rindo de você e a cidade um lixo. Mas você continua vivo. Então ponha as mãos pro céu e diga suavemente. – Aleluia.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Droga mata

Não quero mais droga nenhuma, te amar eu quero, sem viajar. Nada de ficar alterado porque (...) não dá pra controlar – nos dias de hoje. Você não tem medo?
Ficar aqui ouvindo Serge Gainsbourg e parar de fumar, tudo de uma vez não talvez, mas o cigarro de Gainsbourg. Droga mata – desgasta: paralisa. Ouvindo o Serge Gainsbourg, um cara assim – depois de tanto tempo, será que ele fumava ainda? That’s danger now...
Oh, je t’aime, não vá olhar pra trás e amarelar. Eu já parei, depois o problema foi da Amy Adega, a princesa moura esquecida da própria língua e das possibilidades de (com ela, com a língua pura e afiada) evitar a morte. Hesite, conecte-se com as vibrações lusas e anglosaxãs tão normais entre nós brasilianos, tão freqüentes – e tão urgente pela necessidade de o tempo precisar parar. Pra você poder subir à nave comigo.

sábado, 16 de julho de 2011

Dialética Cristã

O que foi mesmo que disse o Jesus, em sua peregrinação de volta a Nazaré, que o Pedro ou João chegou junto e observou, “sua mãe está aí’. E Cristo respondeu, “mas eu não tenho mãe” – foi isso que ele disse? E depois quando ele glorioso chegava ao templo em Jerusalém, a igreja cheia de ambulantes no pátio à entrada da sinagoga gritando, “meu profeta”, “minha estrela de Davi”, “minha pedra preciosa”, quanto vale isso? Jesus pegou do chicote ralhando com aquela gente folgada e tratante, “a casa de deus não é uma loja de quinquilharia”, “saiam daqui”, “vão embora, seus miseráveis”, não foi isso? Saiu derrubando tudo, bancas e barracas e comerciantes endemoninhados, louco o Jesus, louco de raiva... Mas ele já tinha uma multidão atrás de si, ouvindo as parábolas – mesmo assim foi crucificado. Quanto mais eu que não tenho retaguarda embora me sinta eu mesmo um cristo. Fui me meter a besta, todo santo e malcriado, me dei mal, acabei jogado no canavial, sangrando, com as pernas quebradas e o orgulho ferido. Só depois, agora, me lembrei dos episódios de ira e frieza na legenda cristã. A indiferença do filho à presença de Maria, pois que ela era uma mãe e ele o filho de deus... A agressividade escandalosa dele diante de todos à entrada do templo, orgulhoso ele – perdeu a paciência, tem horas que nem mesmo o deus aguenta. Mas isso tudo finalmente é pedra cimentada pra mim, resguardo: E tesouro racional de um deus ao outro, a despeito de eu ser apenas uma partícula infinitesimal. Eu me livro do mal com a sabedoria dos deuses e quando o mundo vem abaixo simplesmente respiro fundo e continuo.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Que o Diabo me carregue

Eu não sei em que momento o diabo me carregou, quando foi que deixei de sentir ou de perceber o meu espírito e a minha própria pessoa – onde estavam o meu espírito e a minha consciência transparente e desbravadora quando o imundo me pegou pelo braço e me levou consigo voando sem que me desse conta das horas e das ruas e da paisagem urbana? Eu me voltei e lá estava eu de frente para o guarda: Ele me deu um soco, puxou minha perna e pisou com o coturno na minha cara. Não, isso não aconteceu – mas o que foi que rolou nessas horas em que voava pela cidade nos braços de satanás? “Boa noite, Cinderela”, me cumprimentou o padre, vestido de gala, com a batina preta justa e elegante, à porta da catedral. Eu não estava só, lá dentro uma multidão de fiéis se ajoelhava e de cabeça baixa orava o pai nosso. “Em nome do pai, do filho e do espírito”, valei-me meu santo Antônio, a vida ficou difícil e besta e o tempo precisa correr pra alcançar o topo da roda, ó, minha pequena fortuna, a gincana chega ao arremate: Quem sou eu, pergunta Jasão à época da grande tragédia. Eu paguei o preço e calei a esfinge – saí com o olho furado, o que mais podia querer você de mim? Sei bem porque isso acontece, o diabo me carregando sem garantia de retorno e a roda girando, às vezes homem, às vezes besta-fera – eu podia fazer um esquema e explicar tudo direitinho, mas pra quem, pra minha alma desolada e chorosa detonada por essas quedas todas?

Antes que Ela diga Adeus

Dando um tempo na postagem do livro 'Álbum de Família'...












Antes que você me diga adeus, eu preciso dizer que te amo, que mesmo tendo sido uma única vez, valeu por um milhão de vezes, não sei como explicar, fico pensando, “ela nunca vai voltar nem ligar pra mim”, será? Deus o abençoe, você me fez sentir novo e eu me desenvolvo com experiência, assim, na cama, ficou tudo bem, como poucas vezes... Mas eu sou impaciente: Quando ele vai ligar, acho que nunca, mas nunca é muito forte de dizer, talvez, quem sabe, pode ser, por que não...

quarta-feira, 1 de junho de 2011

(9) Doce Vida de Regalo e Prazer

Assustada e perdida na vida
A essa altura da vida
E ele lá do outro lado do rio, plantando banana
Cheio de compostura
Ela também cheia de vida
Mas perdida, esperando ele passar

– Ele vai te amar um dia, querida
Pode apostar, vai ser bom pros dois
Então ela se pôs a criar, fazer crochê, tricô
E plantou rosas

Ah, as mulheres, elas só querem amar
E gostar muito de você, pode apostar

Então o mundo deu passagem
Ela voltou a olhar pra frente
As bananeiras deram fruto
O astral mudou, o dinheiro entrou
Tornaram-se casal, ela aqui
Ele do outro lado do rio

Pescando tilápias, arriscando a vida na noite
Bêbado feito um gambá
Gostoso, que bebedeira gostosa
Ele tomando todas, sem ligar
Ela junto, cuidando

domingo, 27 de março de 2011

(8) Início, Oposição ao Início, Realização

foto: Willians Valente


















Maravilhas da Antiguidade, escritas na pedra e no couro, muita coisa relegada, mas que foi resgatada por um impulso forte e pelos esforços diários e noturnos: Não esqueça de anotar as noites ruins, solitárias, vazias: como um filme de Khoury ou senão dias e noites de sexo cerebral – ou o não-sexo, que é o que acontece sempre... Mas voltando às histórias do passado remoto, ali estão as causas, as predestinações, o caminho trilhado desde o começo: Nós todos temos um início, um meio e um fim: eu estou no meio ou no fim do meio já que o meio também tem o seu começo... Geralmente é assim:
1-2-3: Início, compreendendo o início do início, oposição ao início (meio do início) e fim ou realização do início: do momento que veio à luz até os 30 anos;
4-5-6: Oposição (meio), seguindo a regra, início de oposição, oposição à oposição e realização (fim) da oposição: dos 31 aos 60 anos;
7-8-9: Realização, dos 61 aos 90 em média, mantendo ad eternum o principio: início, meio e fim.

sábado, 19 de março de 2011

(7) É o que Eu digo sempre
















Há quanto tempo assim, sem vontade de dizer nada, esperando, afinal, que você me peça em casamento. É muito tarde pra casar, não penso mais nisso, talvez um compromisso, o que acha? Mas nem isso, bem, não quero saber, não quero falar de nada disso, estou exausto, nada que me conforte ou me console, quantas vezes você me abraçou e me tomou nos braços, me tocando mesmo de verdade, esquece, não estou reclamando de nada, só estou... Resmungando. Eu, o cara imprestável pra se relacionar, não sabe cativar, não prende ninguém ao seu lado, eita, bicho enjoado, tanto que eu faço pra lhe agradar, chupando sua nuca, em silêncio, pra dizer baixinho, “eu te amo”.

álbum de família

é o livro q estou postando, acompanhe do início (veja a numeração dos posts)...

terça-feira, 8 de março de 2011

(6) A Roda da Fortuna

















O desejo de voltar atrás, mas não há nada que se possa fazer: estou bem, relendo os meus pensamentos gravados na pedra: um hábito antigo de meus ancestrais, escreviam tudo na pedra e no couro dos animais. Mas escreviam pouco, maior era o desejo de reprodução da prole, e de matar, ah, espero que esses desejos sobrevivam a minha herança sertaneja, sem esperança alguma de fortuna, as pedras rachando ao sol desértico, o capim seco do pasto, os bichos morrendo, e as palavras, as minhas palavras, é tudo o que tenho.

(5) Cerveja e Morango
















De volta ao espaço lúdico de um dos meus sete corpos, à atmosfera musical dessa minha criatura e aos devaneios em si, quer dizer, à Literatura! Nada mais justo depois de tanto derrame de sangue... Agora os anjos do Senhor derramam sobre o meu rosto filtro de puro amor solar, e o brilho das estrelas. O diabo se irrita e rodopia tanto que dá pena, minha pele recupera o vigor, cicatrizes desaparecem, o calombo, as coisas ganham outro sabor, como sabor de cerveja e morango.

domingo, 6 de março de 2011

(4) Corpus Christi


Inexatamente, a cada passo que dou, não pelo fio da calçada e sim à margem da rua, prestes a cair no buraco. É dessa forma que vivo, como se não houvesse um leme, um freio, uma direção: Há uma direção que é deus e por ela me conduzo alegremente: assim não caio no buraco, pulo, salto, corro e danço no asfalto. E por esses caminhos de terra, várzeas e rios e lagos: E pelo ar, no fundo do mar também em que me lanço como âncora antiga e pesada, cheia de sinuosidade: e de uma maldade preciosa que é crosta, ferrugem e resistência. Graças a deus, graças a deus estou vivo, mesmo caminhando assim de sobressalto, turvo, girando em torno de si mesmo como um peão louco e infantil, fazendo graça, cativando as pessoas e mimando elas: E irritando outras, arrancando a pele de uns em carne viva.

(3) Doce Vida de Regalo e Prazer















Assustada e perdida na vida
A essa altura da vida
E ele lá do outro lado do rio, plantando banana
Cheio de compostura
Ela também cheia de vida
Mas perdida, esperando ele passar

– Ele vai te amar um dia, querida
Pode apostar, vai ser bom pros dois
Então ela se pôs a criar, fazer crochê, tricô
E plantou rosas

Ah, as mulheres, elas só querem amar
E gostar muito de você, pode apostar

Então o mundo deu passagem
Ela voltou a olhar pra frente
As bananeiras deram fruto
O astral mudou, o dinheiro entrou
Tornaram-se casal, ela aqui
Ele do outro lado do rio

Pescando tilápias, arriscando a vida na noite
Bêbado feito um gambá
Gostoso, que bebedeira gostosa
Ele tomando todas, sem ligar
Ela junto, cuidando

ÁLBUM DE FAMÍLIA

Postando as páginas do livro...

quarta-feira, 2 de março de 2011

(2) Dias de Glória



Do livro "Album de Família"

































Os dias dramáticos de luta pela liberdade na terra: na água e no ar, na mente, no sangue dos ancestrais: Calabar, o deus morto, o herói a ferro e fogo lá atrás. Dias mágicos, dias práticos, grandes fantásticos dias de guerra atingindo a carne: o fio da navalha, a correnteza, ó Manguaba, ondas vão e vêm sob os motores, os braços dos meus amores, meu rio, meus super-heróis.

O barco na retaguarda afundando em chamas, a vida clama incerta, um canto fúnebre no alto da colina, o grito de guerra cá embaixo, meu próprio coração um tambor. Esqueço o tempo, o espaço onde estou, a vida tem sabor de cerveja, e a recompensa do banho livre, no fim da estrada, a estrada do rei, meu rei, sabe o que mais, esses dias são gloriosos!

(1) O que disse o Pai em seu Leito de Morte


Do livro "Álbum de Família"




































A dura realidade da vida
Me disse o pai no leito de morte
Uma escura via à descida
O vislumbre da subida
A vida depois da vida depois da vida

“A sutura da minha ferida”
Apontou o pai – o seu corpo – àquela altura da vida
A deusa vencida
A despedida...
Olhei pra trás e não o vi mais
Adonai!
Adonai!

ÁLBUM DE FAMÍLIA


Novo livro: a partir deste post, os fragmentos vão enumerados, indicando as páginas do livro...